Estratégia em tempos de Ruptura Digital

Este artigo de Freek Vermeulen, da HBR, provocou uma discussão acalorada sobre este importante tema. Sendo estratégia um dos pilares da metodologia 5DSL de nosso instituto, oferecemos um resumo e considerações adicionais sobre este tema que não recebe a atenção, rigor e diligência que demanda, seja na Diretoria, seja pelos proprietários da empresa.

Iniciamos dizendo que o conforto é uma preocupação contínua em si, que cria vários males, sendo um deles uma miopia de gestão conveniente, que é um tema que nossa metodologia aborda. Para o propósito desta discussão, todos nós vimos em nossa história recente (últimos 15-20 anos), negócios sólidos e rentáveis sendo condenados por suas respectivas equipes de alta administração que não estavam dispostas a corrigir sua miopia: Motorola (StarTac x telefones digitais); Nokia (smartphones x telefones com tela sensível ao toque); Wikipedia x Britannica (mencionado no artigo) sem mencionar a miríade de interrupções do modelo de negócios que o Google/Alphabet criou em áreas como armazenamento, mapeamento, sistema operacional para celulares, pesquisa, mídia digital e muito mais.

No artigo, Freek lista 4 “crenças” que ele considera simplificadas demais, e que comentamos:

 1) Efeito de Rede: O vencedor nem sempre leva tudo.

Sob este item, minha experiência mostra que não se trata de ganhar tudo ou não, mas sim em qualquer nova atividade, sim, há uma situação conquista e domínio de espaço.

Um exemplo anterior ao artigo foi a introdução da TV a cabo. Cada operador teve que construir uma infraestrutura de cabos em toda a cidade. Pense em São Paulo, Nova Iorque ou Buenos Aires, todos com 10MM+ habitantes. Quem ganhou? Quem implantou sua rede mais rápido! Simples assim! Nesse caso, “o vencedor leva tudo” na verdade era (ou deveria ter sido) parte da estratégia.

O exemplo do aplicativo de táxi oferecido no texto original representa a perspectiva de negócio em andamento: Em vários países da América Latina (não apenas em Cingapura como no artigo), houve uma miríade de aplicativos de chamada de táxi. Em um ponto eu contei doze só no Brasil. Talvez os motoristas tivessem apenas um telefone; no entanto, a média de aplicativos em execução era de quatro. Hoje no Brasil a paisagem está mostrando basicamente três deles. E todo taxista opera com todos eles. Ou seja, sim, existe um vencedor, mas ele não levou tudo!

Agora, dois aspectos para os perdedores lembrarem e considerarem:

a) Sim, nos primeiros momentos existe uma situação conquista de território. Naquela época, o objetivo era garantir uma massa crítica de usuários para tornar o modelo de negócio realmente viável. Quem entrou tarde ou não conquistou essa massa crítica inicial, morreu. E isso incluiu iniciativas bem apoiadas financeiramente.

b) A propriedade ou cooperativa de táxi (intermediário!) é quem está realmente morrendo como resultado dessa ruptura. Por que um dono de táxi pagaria cerca de R$ 800 por mês a uma cooperativa, o que deve gerar corridas se eles o tiverem a baixo custo nos aplicativos? Eu vi algumas dessas cooperativas reduzindo a assinatura mensal em (acreditem) 80%!

2) Complementos não são substitutos.

Apesar de concordarmos com a avaliação de Freek sobre este tema, devemos contextualizar. Ele estipula que os substitutos são mais frequentemente a exceção do que a regra, e isso é correto. Além disso, quando você pensa em substitutos, você deve pensar de maneiras mais convenientes de fazer a mesma coisa; enquanto os complementos são para melhorar uma experiência ou uma capacidade/funcionalidade.

Por exemplo fax foi substituído por e-mail. Mas o objetivo ainda é o mesmo: comunicar via texto. Já Skype, WhatsApp, Telegram e Wechat são outras formas talvez mais convenientes e rápidas de se comunicar via texto, portanto são complementos. Porém o email segue como o grande armazém de acordos comerciais, por exemplo.

Às vezes, a ruptura digital mata os intermediários, estes sim os mais frágeis. Veja o exemplo acima de cooperativas de táxi. No entanto, o negócio real (táxi, transporte) ainda está lá, trabalhando, tanto quanto o transporte em si, inalterado!

As perguntas para você fazer durante as estratégias são:

a) Como posso melhorar meu alcance de mercado ou minha experiência de serviço com digital?

b) O que está acontecendo em torno do meu negócio, o que está sendo desenvolvido que pode substituir ou complementar o que eu forneço atualmente?

3) A geografia (ainda) importa.

A geografia sempre importará. Vivendo em um país “periférico” (Brasil) no que se refere à inovação, tenho visto muitas, realmente muitas empresas falhando na tentativa de copiar (nem mesmo replicar) seu modelo de negócio bem comprovado nos EUA ou na Europa e aplicá-lo no Brasil. Por exemplo, vemos Cabify e Uber ajustando seu modelo para prosperar por aqui, especialmente com a economia em queda. Por que isso acontece? Por uma variedade de razões, das quais destaco algumas, consideradas as principais, utilizando os modelos Cabify e Uber como exemplo e considerando minha experiência no Brasil e na América Latina:

a) Cultura. O deslocamento da Uber em NY é em média muito mais longo do que os do Rio de Janeiro. Como isso reflete no modelo? Ruim para os motoristas cariocas. Eles precisam trabalhar muito mais horas para alcançar receita equivalente.

b) Legislação Trabalhista: Não só no Brasil ou na América Latina, isso está em todo lugar. O modelo de negócio para motoristas só faz sentido no Brasil se ele dirige 12 horas por dia, 6 dias por semana. Agora, isso é uma relação de trabalho, de dependência, ponto final. O que estes operadores devem fazer com seu modelo de negócio para que ele realmente funcione como um complemento à renda de um motorista? Não foi essa a ideia original?

c) Implicações fiscais: aqui, se você comparar com um taxista licenciado, um motorista de aplicativos está morto, financeiramente falando. Enquanto proprietários de táxi têm cerca de 35% de desconto para renovar seu veículo a cada 2 ou 3 anos, dependendo do estado, motoristas de aplicativos não. Considerando a depreciação do veículo já demonstra que uma viagem de aplicativo custa mais ao motorista do que a uma viagem de táxi!

As peculiaridades do mercado regional devem estar no cerne das Rupturas Digitais ao crescer seus negócios no exterior. Da mesma forma, se você está planejando adicionar ruptura digital ao seu negócio, seja sensível às diferenças regionais.

4) Velocidade? Não tão rápido. Será?

Sim, não tão rápido. Ouvimos, em um passado não tão distante, que as empresas devem continuar a se reinventarem, como a “única” maneira de prosperar em um mundo em rápida mudança. Bem, quem são os gestores ou os membros do conselho que matariam ou até mesmo reduziriam a receita desafiando a si mesmos? Isso é obviamente insano, no entanto, um desafio interessante no que diz respeito à miopia que mencionei no início deste artigo.

Por outro lado, um líder empresarial deve estar atento a possíveis rupturas (não apenas digitais) e navegar em torno das águas turbulentas que se aproximam com um plano forte, ajustando-o em movimento.

Finalmente, ressaltamos que a vida ainda é real, não virtual. As mercadorias são tangíveis, e sempre serão, mesmo que você não precise sair para comprá-las. O encontro das pessoas é e será físico, presencial; não importa se eles começaram em um site ou aplicativo de namoro. Embora óbvio, devemos resistir à tentação de transformar tudo real, tangível em panaceia virtual. O digital vem como facilitador, como melhora, nunca como um substituto.

Se você possui ou gerencia um negócio, está olhando estrategicamente em como se beneficiar da era digital? Você está olhando para as tendências? Você está olhando para o seu ecossistema e observar como ele está sendo remodelado?

Uma coisa é certa: se você não se antecipar e investir na transformação do seu negócio considerando a era digital, você está levando-o para um futuro sombrio.

Quer falar sobre estratégia? Agende 30min comigo ou com um Conselheiro Capacitado pelo Instituto.

Helder de Azevedo

Helder de Azevedo MSc, CCA IBGC, CCC Celint e BRA

Idealizador do Instituto Empresa DE Família, é também CCA IBGC – Conselheiro de Administração certificado pelo IBGC, onde contribui nas comissões de Conselho de Administração e no Grupo de Trabalho do Agronegócio; Conselheiro Consultivo Certificado pelo Celint e pela BRA Certificadora, onde também ministra o módulo de estratégia e de planejamento orçamentário no Curso de Formação de Conselheiros Consultivos; e associado da ABC³, onde contribui com duas comissões temáticas. Atua como Conselheiro Consultivo na AR70 Corporation e foi Conselheiro Fiscal da Neoenergia/CELPE. Membro do IFERA – International Family Enterprise Research Academy. Mestre em Governança Corporativa com pesquisa em Empresas Familiares e autor do livro Empresa de Família – uma abordagem prática e humana para a conquista da longevidade publicado pela Saint Paul Editora em agosto/2020, disponível também em formato eletrônico, Kindle e outros.

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Artigo originalmente publicado no LinkedIn em: Janeiro de 2017

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